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COLUNA NA PONTA DA AGULHA #023

NAÇÃO SUBTERRÂNEA - AMANDA PRATES Uma obra tocada pelo sagrado que vem das culturas indígenas e africanas


Cantora e compositora, a mineira Amanda Prates acaba de lançar “Nação subterrânea”, seu primeiro álbum. Sua trajetória artística envolve trabalhos com a música e o teatro, tendo ela, em 2009, fundado o Grupo Girau, em que coordenou atuou até 2014. Nesse período, chegou a gravar dois álbuns, que acabaram não sendo lançados, mas que ainda estão em seu radar para, futuramente, serem retomados.



Rico, conceitualmente, “Nação subterrânea” aborda a religiosidade, que encontra lugar, principalmente, entre as culturas indígenas e africanas, que são fundamentais na construção da cultura brasileira. Ele começou a ser desenhado em 2019, após Amanda coordenar o projeto que resultou em “Korin Irê, do Terreiro de Candomblé Ilé Wopo Olojukan”, álbum que reuniu alguns cânticos sagrados do Candombé e que contou com a produção de Leandro César, excelente músico e produtor mineiro, que tem no currículo os álbuns “Revoada” (ao lado de Irene Bertachini), “Marimbaia” e “Architecture of sounds”, além de trabalhos com músicos como Makely Ka e Rafael Dutra, por exemplo. Em meio ao intenso processo de pesquisa e criação, Leandro instigou Amanda a gravar seu primeiro álbum e, durante a pandemia, a ideia ganhou corpo com a montagem do repertório.





Formado por 12 canções, sendo 11 inéditas, “Nação subterrânea” traz quatro composições de Amanda: O adivinho”, Lágrimas de Exu, Promessa e Senhora; completam a lista: Oração, de Marcela Nunes, Subterrânea, de Thiago Thiago de Mello e Allan Carvalho, Remendo, Clara Delgado e Davi Fonseca, Alumia, de Sérgio Pererê, Mama mata, de Thiago Thiago de Mello e Joãozinho Gomes, Ruge leão, troveja Xangô, de Douglas Germano e Fábio Perón, Quatro Cantos, de Marcela Nunes, e Quem não tem canoa cai n´água, de Zé Manoel, (a única não inédita, lançada pelo artista pernambucano, do disco “Canção e silêncio”, em 2015.


Como compositora, Amanda chama a atenção pelo desenvolvimento de suas melodias de forma criativa, com as partes de suas músicas desdobrando-se de maneira nada óbvia, como é o caso de Senhora. Já Lágrimas de Exu, faixa instrumental, traz a curiosidade dela ter sido composta a partir da voz, uma vez que Amanda não é instrumentista, o que demonstra sua enorme de capacidade de criação musical.


Como cantora, Amanda combina muito bem técnica e emoção (o que aprofunda o caráter sagrado, que emana do conceito do álbum), apoiada nos ótimos arranjos criados pelo Leandro César, seja nas canções com sonoridade mais indígena, como Subterrânea e Mama mata, ou as que trazem um enfoque mais afro-brasileiro, como O adivinho e Ruge leão, troveja Xangô, duas faixas, que remetem aos trabalhos de Moacir Santos, mestre na orquestração de sopros e percussão.


Na instrumentação, tendo à frente Leandro César, no violão, marimba e tri-ré, Amanda é acompanhada por um grupo de artistas de enorme qualidade formado por João Paulo Drumond, na marimba; Juventino Dias, no trompete; Leonardo Brasilino, no trombone; Marcela Nunes, na flauta; Ayran Nicodemo, no violino; e Jayaram Márcio, no violoncelo.

Mesmo a partir de um repertório composto por diversas mãos, Amanda conseguiu criar algo uma obra coesa, em que grande parte da sua força está no conjunto. “Nação subterrânea” é um álbum feito com extrema sensibilidade, dando-nos a oportunidade de apreciar o sagrado e enxergar a importância dos fundamentos da nossa cultura, o que é um verdadeiro presente neste momento em que o mundo, cada vez mais apegado ao que é material, precisa dar mais valor ao que realmente importa.







Coluna publicada no site Itaú Cultural por: Jorge Lz


Carioca, radialista, curador, pesquisador musical, produtor cultural e DJ. Produz e apresenta o programa semanal Na ponta da agulha, na Rádio Graviola, é curador do Festival Levada e integra o Radialivres, coletivo de radialistas do Brasil. Foi idealizador e curador do Festival BRio e do projeto Verão musical no Castelinho, e produziu e apresentou os programas Geleia moderna, Radar e Compacto, na Rádio Roquette-Pinto


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