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COLUNA NA PONTA DA AGULHA #021

QUEDA LIVRE, DE CAXTRINHO Um olhar atento de quem dá aos figurantes o protagonismo que lhes é devido.



“Gosto de falar dos figurantes, o protagonista não me interessa tanto.”


Assim declara Paulo Vitor Castro, o Caxtrinho, nascido em Belfort Roxo, na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro. A frase, que está em seu release, sintetiza o que entramos em contato ao ouvir “Queda livre”, seu primeiro álbum, que chegou nas plataformas digitais, no final de agosto, em edição do QTV Selo, que celebra 10 anos de excelentes serviços prestados à música, com um catálogo de primeira, com nomes como bella, Juçara Marçal, Kiko Dinucci, Mbé, Saskia e Tantão e Os Fitas, entre outros.


Cantor, compositor e violonista, Caxtrinho, em dez canções, nove das quais são de sua autoria, sendo algumas em parcerias e apenas uma, Merecedores, assinada por Kau, constrói uma crônica urbana, em que, através de um texto afiado, ao mesmo tempo, direto e poético, desfia as complexidades da Baixada Fluminense, região rica culturalmente, mas pouco favorecida pelo poder público, dando protagonismo aos tais figurantes, ao relatar o dia a dia de quem é normalmente invisibilizado.




Se o texto é afiado, a parte musical segue na mesma batida, ou melhor, nas mesmas batidas, já que Caxtrinho trabalha suas composições de várias formas, enriquecendo seus sambas com diversas correntes, que vão do funk ao jazz, passando pelo blues, rock, e por ritmos do nordeste brasileiro.


Os arranjos são um capítulo à parte, a começar pela maneira altamente percussiva com que Caxtrinho empunha o instrumento, criando a tensão perfeita para embasar seu discurso. As quebras de compasso e uma certa atonalidade em faixas como Branca de trança, parceria com Xuxuvevo, ou Papagaio, nos remetem à Vanguarda Paulista, principalmente, de Arrigo Barnabé, ainda que isso não se configure em uma influência direta. Segundo Caxtrinho, uma de suas maiores influências é Luiz Melodia, que paira sobre o samba esperto Brankkkos, que conta com a participação especial de Negro Leo e no já citado samba jazz atonal, Papagaio.





“Queda livre” foi produzido por Vovô Bebê e Eduardo Manso, que são dois artistas extremamente criativos e abertos às possibilidades de experimentação, tanto como produtores, como em seus trabalhos autorais. A dupla conseguiu criar o ambiente ideal para que a potência de Caxtrinho fluísse perfeitamente. Além disso, se encarregaram da instrumentação, com o primeiro, na guitarra e flauta e o segundo, na guitarra, sampler, rhodes, sintetizador, escaleta e harmônio. Juntaram-se aos dois, João Lourenço, no baixo e Phill Fernandes, na bateria. O álbum ainda conta com as participações de vários nomes do cenário musical contemporâneo, com destaque para Ana Frango Elétrico, no coro em Branca de trança, além de voz e piano em Merecedores, que também conta com as vozes de Tori e Bruno Schiavo; e Thomas Harres, na percussão, em Papagaio, Rolê na B2 e na faixa título Queda livre, parceria do Caxtrinho com Kau. Outros destaques do álbum são Samba errado, parceria do Caxtrinho com Romulo Fróes, um encontro de Rio e São Paulo nesse ótimo samba, que de “errado” só tem o nome; e a instrumental com toques de psicodelia Vó jura.


Autêntico e convicto, Caxtrinho traça seu caminho musical firme, sem cair no canto de sereia do pop-chiclete-tropical, optando por uma estética livre de amarras, criando, assim, uma obra consistente, instigante e sofisticada, que além do enorme valor artístico, ainda traz à tona uma discussão importante ao colocar os figurantes no seu verdadeiro lugar, que é o de protagonistas.






Coluna publicada no site Itaú Cultural por: Jorge Lz


Carioca, radialista, curador, pesquisador musical, produtor cultural e DJ. Produz e apresenta o programa semanal Na ponta da agulha, na Rádio Graviola, é curador do Festival Levada e integra o Radialivres, coletivo de radialistas do Brasil. Foi idealizador e curador do Festival BRio e do projeto Verão musical no Castelinho, e produziu e apresentou os programas Geleia moderna, Radar e Compacto, na Rádio Roquette-Pinto


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